Logo que seu irmão mais novo nasceu, sua família mudou-se para a cidade de Santo André, mas pouco mais de 1 ano e meio depois mudaram-se para Rio Grande da Serra, que na época não tinha o atual nome, por conta da fábrica em que seu pai trabalhava. Desde muito cedo começou a trabalhar e aos 14 anos quando tirou a carteira profissional conseguiu trabalhar como ajudante em uma oficina mecânica e mais tarde conseguiu emprego em um banco. Em 1975 ingressou no IMES como aluno no curso de Ciências Econômicas e depois graduou-se em Administração também no IMES. Enquanto aluno, foi presidente do Diretório Acadêmico; começou a trabalhar como monitor de alguns professores, nesse momento começa a lecionar no IMES dando revisão aos alunos para melhorar o rendimento deles. Sua esposa estudou Direito e é advogada, dos seus três filhos, uma filha estudou Rádio e TV no IMES; tem dois netos. |
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Pergunta:
Pra gente começar, queria que você falasse, por favor, nome completo, local e data de nascimento.
Resposta:
José Carlos Garé, nascido em Votuporanga, estado de São Paulo, 28 de março de 1954.
Pergunta:
E o que você lembra dessa primeira infância em Votuporanga?
Resposta:
É uma coisa hoje que quando você fala de musica sertaneja de raiz. É você voltar a infância, onde você não tinha supermercados, era o padeiro que passava na sua porta e vendia pão, e depois vinha o que vendia leite, e depois o que vendia carne, poucos açougues, São Roque, terra batida. O amolador de faca tocando seu apito, o vendedor de biju, o vendedor de pirulito, essas são as lembranças da infância que ainda em alguns poucos lugares, se não mais a figura do padeiro, ou do açougueiro de porta em porta ou do leiteiro, mas ainda um pouco, do que foi a infância, um pouco mais de sessenta anos, perto disso.
Pergunta:
Ele ia lá e deixava o leite na porta?
Resposta:
Sim, você reconhecia pelos apitos, além dos dias certos de passar, você reconhecia pelos tipos de apito ou buzina. Quando você ouvia um determinado tipo de apito ou de buzina, você sabia que o leiteiro estava chegando, ou que o vendedor de biju estava chegando, ou que o padeiro estava chegando, ou que o amolador de faca estava chegando, era assim, a comunicação era sonora.
Pergunta:
E como era na sua casa, você tinha irmão?
Resposta:
Não, eu tive um irmão tardio, meu irmão ele é 7 anos e meio mais novo que eu, nascido também no interior, na cidade de Olímpia, mas nós temos uma diferença de 7 anos e meio, e logo que ele nasceu nós viemos para Santo André, então assim, parte da minha infância foi aqui, eu vim pra cá perto de oito anos.
Pergunta:
E que mais você lembra desse período em Votuporanga?
Resposta:
Estado da boiadeira que você fala, eu acho que se canta o estado da boiadeira, a boiada, os burros, as mulas de canga que traziam tudo que se produzia nos sítios, para vender nas lojas da cidade, o corte de cabelo com maquininha ainda, que não era elétrica, a lembrança de molar navalha no couro, e pescar, pescava muito. Muitas festas, estamos aqui agora em época de festa junina, então a cidade do interior é muito rica nas tradições de São João, São Pedro, Santo Antonio, folia de reis, essas tradições de cunho normalmente religioso, as quermesses, as procissões, isso tudo é coisa de interior, não é?
Pergunta:
Como eram seus pais, José?
Resposta:
Meu pai trabalhou quase a vida inteira fabricando bebida, então ele é quase um expert em bebida, Guaraná, Soda, refrigerantes e algumas bebidas alcoólicas, minha mãe domestica, cuidava de casa, e a lembrança é que nos tempos, nos fins de semanas vagos ou eu saia com meu pai para pescas, ou ele saia para caçar e eu não ia, isso fazia parte daquele tempo de caçar, então, a tradição das famílias, os homens se reunirem pra sair para caçar e sair para pescar.
Pergunta:
Você é bom de pesca?
Resposta:
Eu sou, mas como dizem que todo bom pescador é mentiroso... mas eu aprendi muito com o meu pai, é um adoce lembrança, fui assim um bom companheiro durantes muitos e muitos anos, mesmo depois da infância.
Pergunta
E as suas amizades nesse primeiro período?
Resposta:
Eu tenho parentes lá, amigos deixei com 7 para 8 anos, então não deixei, mas parente eu tenho, e a cada dois três anos eu volto pra lá, e a ultima vez que lá estive [5'], há dois anos e meio eu quis realmente retornar a infância, e então eu calcei um bom tênis bem confortável, e fiz todo o roteiro de quando eu fazia na infância, e que hoje são condomínios, comércios, mas assim, voltei o filme perto de 60, 65 anos, e fui comparando o que era, o que tinha na lembrança e hoje, e é uma diferença brutal.
Pergunta:
E qual foi a sua sensação?
Resposta:
Foi muito boa, foi quase que um resgate assim ao passado, a infância sempre é boa, de você lembrar, e ver a transformação da cidade, ver como tudo aconteceu e dizer assim, a casa que eu morava já não é mais a mesma, mas a que eu vi construir, sai para ir la visitar porque sabia quem morava lá, algumas ainda permanecem, outras não permanecem mais.
Pergunta:
Fala um pouco dessa mudança, então sua família saiu de Votuporanga e foi para Olímpia?
Resposta:
Isso, um tempo muito curto, uma época em que meu pai precisava fazer cirurgia e minha mãe estava grávida, então o filho por nascer e a cirurgia por fazer, ai fomos para morar em Olímpia porque meus avos moravam em Olímpia, uma cidade perto de Votuporanga, cento e poucos quilômetros. Então ficamos um ano em Olímpia, tempo necessário para meu irmão nascer e meu pai se recuperar, e a terra de oportunidades então era São Paulo. Como tinha uma irmã da minha mãe que morava em Santo André, nós viemos pra morar numa casa, no mesmo quintal, em uma parte da casa, um anexo, viemos pra cá. Isso foi no ano de 1962.
Pergunta:
E como este ano, era ano de copa do mundo.
Resposta:
Ano de copa do mundo, recordo muito bem, me lembro muito mais dos nomes dos jogadores da década de 60, 62 do que de hoje, porque os bares viviam cheios de homens, colecionavam figurinhas igual hoje, e ele faziam assim de sábado, de manhã iam a missa, e depois iam beber até a hora do almoço, e eu naquela época engraxava sapato, eu tinha uma caixa de engraxate, então eu ficava na porta do bar, e eu não ouvia outra coisa que fosse o nome dos jogadores, do técnico Feola, garrincha, Pelé, então eu lembro muito mais do que hoje se me perguntarem , até porque eu nunca fui muito afeito a futebol. Não torço pra time nenhum, não sigo, não acompanho, quando muito sei quem é o goleiro porque eu sei onde ele fica, mas do resto eu não sei.
Pergunta:
Fala um pouco sobre essa vinda para Santo André, e assim, já com 9, 10 anos, como foi o finalzinho dessa primeira infância.
Resposta:
Em Santo André permanecemos muito pouco, nós ficamos perto de 1 ano e meio, porque em Rio Grande da Serra, que naquela época se chamava Subdistrito de Iguatuaçu, ainda era município, tem uma fonte de água muito boa pra fazer refrigerante, chamada água mineral, e ali se instalou uma fábrica de bebidas, e meu pai foi convidado pra ser o fabricante de bebida naquela época, então eu passei boa parte da minha infância, depois de um ano, um ano e meio em Santo André, o que é hoje Rio Grande da Serra, num bairro de Rio Grande da Serra, no meio do mato, porque aquilo tudo era mato, ali sim foi uma infância diferente, então combinava pescaria com jogar bola, rodar pião, e acompanhar meu pai na fábrica de vez em quando, que eu trabalhava de vez em quando com ele lá, em rotular garrafas, rolhar, tampar os litros de bebida, então parte ficava com ele, parte ficava na rua jogando bola, rodando pião, que bom, hoje as brincadeiras de criança não tem mais. Empinando pipa, papagaio, e andando muito a cavalo. Isso foi mais de 63 até 65.
Pergunta:
E a escola [10']?
Resposta:
Escola é um negócio que hoje quando eu passo por Rio Grande da Serra, eram 5 km para ir e 5 para voltar a pé. Isso era o que nós fazíamos todos os dias para irmos ao grupo escolar, onde eu terminei meu grupo escolar, em Rio Grande da Serra, em 1965.
Pergunta:
E sua relação com os professores, com os amigos da escola?
Resposta:
Muito bom, muito bom. Era uma relação bastante afetiva. A lembrança que eu tenho dos professores antigamente, os de hoje, era uma relação muito mais próxima, muito mais afetiva do que se tem hoje. E era só meio período também, ninguém ficava na escola o dia todo.
Pergunta:
Você já falou que teve essa experiência como engraxate, como que foi esse começo do trabalho, nessa questão de buscar o próprio dinheiro, como que foi?
Resposta:
Eu comecei a trabalhar com 10 anos de idade indo a fabrica de bebida com meu pai. Muitas vezes não tinha o que fazer, então pra ficar até menos ocioso, uma boa parte do tempo eu o acompanhava na fábrica de bebidas, então ali eu aprendi a fazer uma série de coisas, e eu o auxiliava. Depois, quando essa fábrica de bebida fechou, nessa época já tínhamos uma horta, já colocava ali repolhos e algumas hortaliças que estavam ali em excesso, e eu saia para vender isso na comunidade, era uma vila pequenininha, e eu colocava num carrinho, eu mesmo que fiz isso com uma caixa de tampinhas de garrafas que eram da fábrica, e vendia alguns repolhos lá, então eu sempre gostei disso de, comprar vender e fazer alguma coisa. Depois que sai de Rio Grande da Serra, nós fomos pra Itanhaém, que era uma outra fábrica de bebida.
Pergunta:
Então meio que a família acompanhou os trabalhos do seu pai, não é?
Resposta:
Eu tenho uma lembrança que antes da minha mãe completar 17 anos de casada ela já havia mudado mais de 17 vezes. Ela se mudou mais do que o tempo que ela estava casada. Ali em Itanhaém eu também estava na época em que eu entrei no ginásio, naquela época se falava ginásio, em 1967. Tinha o exame de admissão, ali eu fui um autodidata para estudar, porque era difícil você entrar no ginásio, e ai eu consegui a vinda pro ginásio, a transferência, meus pais vieram primeiro, não tinha vaga aqui, a fábrica fechou, meus pais retornaram pra casa da minha tia de origem, de 1962, de novo em Santo André, e eu fiquei morando de favor para uma senhora por 4 meses, até conseguir vaga pra vir pra cá.
Pergunta:
Como era morar em uma cidade de praia nesse período?
Resposta:
Era bom, porque quando você tem doze, treze anos de idade, praia é tudo de bom, né? É tudo que você quer. Ali também era tudo deserto, tudo areia poucas casas, e ai sim, muitas amizades, e ali tinha uma diferença de infância, porque você tinha as casas de veraneio, então você tinha poucas pessoas que habitavam, então seu círculos de amigos era pequeno, mas nos fins de semana e principalmente férias, que você tinha casa de veraneio, então era outro tipo de amizade.
Pergunta:
De volta pra Santo André?
Resposta:
Volto pra Santo André, ai você falou: o que você fez antes, né? Tem uma lista de coisas. Pintar túmulo de cemitério, vender velas em dia de finado, vender melancia em dia de finado, ajudar na época em que as casas estavam sendo construídas, peneirar areia, carregar tijolo, tive carrinho de doce na porta do colégio, com 14 anos de idade. Fui trabalhar em loja de sapato. Ai eu, com 14 anos de idade podia tirar a minha carteira profissional de menor. Ai eu tirei minha carteira de menos, e ai eu pude ir trabalhar como aprendiz de mecânico.
Pergunta:
Ai é totalmente né, diferente [15']. Pra quem eu achei lá no começo ia sempre estar voltado para as bebidas, né, com seu pai, você citou 3 aí que seriam bem diferentes, pintar túmulos...
Resposta:
Época de cemitério, de finados, as pessoas iam lá no cemitério, olhavam aqueles túmulo que, tradicionalmente, tinham flores, e você falava assim: Essa família gosta de quem está aqui, então ela cuida do que está aqui. Então você passava lá pelos fins de semana, olhava as famílias e perguntava: Quer que eu pinte o túmulo para vocês? Era bem certo que havia alguém que pintasse o túmulo para ele.
Pergunta:
Qual cemitério?
Resposta:
De Camilópolis, Santo André.
Pergunta:
E como é uma pessoa de doze, treze anos...
Resposta:
Ah, eu sempre goste gostei de trabalhar, ter meu próprio dinheiro.
Pergunta:
Nunca foi dependente dos seus pais...
Resposta:
Não, nunca fui dependente dos meus pais. Até porque, na ocasião eu comecei a fumar muito cedo. Eu comecei a fumar com 12 anos de idade. Eu precisava do dinheiro pra ter meu cigarro. Sempre trabalhei. Antes da minha carteira profissional, com 13, 12 anos, eu comprava minha roupa, meu calçado. Minha mãe, em nome da minha mãe que comprou, mas quem pagava era eu.
Pergunta:
E essa experiência como mecânico de automóvel como você conseguiu esse emprego?
Resposta:
Batendo de porta em porta em porta, aqui na industrial, quando tinha a general eletric ainda, eu fui passando de porta me porta ali na industrial, e oferecendo para trabalhar. Ai uma pessoa falou assim: Eu tenho um pra começar a lavar peças. Eu falei: Tá ótimo. Ai eu fiquei 2 anos, e isso foi muito bom, porque ai um dia fomos pescar, em Ibitinga, e ai o caminhou, do nada, parou de funcionar, e era a bomba ejetora que tinha enchido de terra. Graças a minha experiência de mecânico, conseguimos arrumar, pescar e não ficamos sem retornar, foi muito bom. E a depois de dois anos eu fui para o banco, comecei a procurar em banco. Mecânica não era minha praia, certo? Então eu pensava, o que eu gostaria de fazer? Eu não me via trabalhando numa fábrica, por exemplo, como operário. E ai comecei a procurar vaga em banco como contínuo, que era o equivalente Office boy. Comecei em banco, em 1970, entregando correspondência na rua, pegava os malotes e saia entregando. E a minha parte era Mauá, Santo André, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, e tinha um jipe que nos levava. Sobe e desce no jipe entregando correspondência, que você é de imaginar que boa parte de Ribeirão Pires e Santo André você só conseguia entrar de jipe 4 por 4 em algumas ruas. Fiquei 6 meses na rua, ai fui trabalhar lá dentro, expedição, com microfilmagem, que tinham acabado de instalar a microfilmagem, em banco eu fiquei 39 anos.
Pergunta:
E você estava acabando o ensino médio. Você continuou avançando nos estudos?
Resposta:
Terminei o ginásio, colegial, aí foi...
Pergunta:
Em qual momento você decidiu seguir o ensino superior?
Resposta:
Eu sempre gostei de economia. Enquanto todos meus amigos queriam fazer qualquer coisa de faculdade, pouco se pensava se fazer em faculdade. Eu já lia sobre economia, tinha revista especializada em economia, relacionada a exame, e eu tinha a ideia fixa de fazer economia. Então eu fui, terminado o colegial, eu fui fazer vestibular de economia, e isso me trouxe ao IMES até hoje.
Pergunta:
Por que a escolha do IMES, por que essa época de decisão?
Resposta:
Você só tinha 2 oportunidades de fazer aqui. Fundação de Santo André, ou aqui, o IMES. A opção pelo IMES foi em função de horário [20'], pois a fundação de Santo André tinha um horário fixo. Começava às 19h e acabava por volta de 22 e alguma coisa, e o IMES tinha um horário moldurado, pois tinha o vespertino. Então começava as 7h, mas tinha um dia que começava as 8 e alguma coisa, então isso me permitia sair com mais tranquilidade do banco, e assistir a aula. Na fundação eu teria sempre que chegar em um horário fixo. Isso foi o que motivou entre eu estudar lá e eu estudar aqui.
Pergunta:
Como foi, você se recorda desse primeiro contato com o IMES?
Resposta:
Me lembro, desci no ponto de ônibus aqui na porta, eu morava em Utinga, não em Camilópolis, desci no complexo A, onde hoje é o estacionamento e vim pagar a taxa no banco Bumirindos, que era aqui em baixo. Me lembro perfeitamente. Isso foi outubro de 1975.
Pergunta:
E como era o IMES? Você recorda?
Resposta:
Onde nós estamos aqui era bar, pizzaria, cheio de casas. O IMES era só essas salas perto do pátio. A parte da frente era o estacionamento, e aquele pátio que esta no prédio, era só aquilo ali. Aquilo era o IMES. Nos fundos, onde tem reitoria, pró reitoria, era tudo casas de famílias, inclusive de parentes de professores, mas era tudo cercado de residências.
Pergunta:
Me fala aqui, como foram a primeiras aulas, e como foi ser estudantes do IMES?
Resposta:
Foi bom, mas era uma outra época completamente diferente, se tinha mais respeito pelo professor, tinha muito mais consideração pelo professor, se estudava muito mais do que se estuda hoje, não tinha dificuldade de absolutamente nada. Depois, terminando a faculdade, o primeiro curso, é que surgiram os retroprojetores, pra você ter uma ideia. Era giz, cuspe e lousa, realmente. As pesquisas eram em bibliotecas, era com muito mais rigor, com muito mais afinco. E as pessoas eram mais maduras, com mais idade do que tem hoje. Hoje o jovem com 22, 23, 25 anos, ele não amadureceu ainda. Não estou falando no geral. Ele ainda é um adolescente, ele ainda fica na casa dos pais até os 30 anos, perto disso. Naquela época, as famílias eram muito mais numerosas. Era comum você ter 5 irmãos, 6 irmãos, 7 irmãos. Até porque era força de trabalho pra te ajudar em casa, então o que era mais comum de um homem de 22 anos, mulher já com 19, mas homem com 22, 23 anos já pensava em se casar, então era comum casamento com 22, 23, 24, 25 anos. Eu me casei com 22 anos e constitui família. O que nos queríamos naquela época? Casar, ter filhos, ter um fusca e financiar uma casa pelo BNH, esse era o sonho de felicidade de todo mundo. E era assim, com 25, 25 anos os adultos já tinham filhos. Com 25, 26 anos só ouvia-se falar de casamento, compromisso. Era uma outra fase, uma outra relação com professor, família, amigos, era tudo muito diferente.
Pergunta:
Tem alguma aula, algum professor, alguma coisa que te marcou muito na lembrança?
Resposta:
Sim. Por exemplo, a aula do professor Leonel [25'], meu professor de microeconomia no segundo ano de curso, no ano de 1977, foi uma aula que me marcou, tanto marcou que quando eu me formei no curso de economia, e fui fazer meu curso de administração eu iria me tornar tutor do professor Leonel dessa disciplina por 3 anos, e por causa disso me tornei professor aqui da USCS, então tem algumas aulas que marcaram realmente. Algumas nem tanto, mas outras, realmente.
Pergunta:
Então você completou o curso de economia, e passou a fazer o curso de administração, é isso?
Resposta:
Sim.
Pergunta:
E você já na mesma atuada, já fez.
Resposta:
Já na mesma atuada, faz o aproveitamento de ensino, então eu terminei o curso de economia em 1979, 1980 e 1981 eu fiz o curso de administração, 1982, 1983 e 1984 permaneci aqui como monitor, no ano de 1982 só do professor Leonel, nos anos de 1983 e 1984 foi além do Leonel, fui tutor de análise microeconômica do professor Ferrante, que está conosco até hoje, do professor Mario Paschoal, e nesse período eu fiz a pós-graduação aqui em administração econômica e financeira.
Pergunta:
Me fala um pouquinho da docência se aproximando, dessa vertente ai da docência, de como você foi se aproximando.
Resposta:
Nos três anos de monitoria eu fui assistindo aula, eu fui assistir todas as aulas, com os três professores. Eu vim toda noite assistir todas as aulas para ver como cada um abordava a disciplina, e depois, durante 3 anos, eu preparava os alunos para a época de prova, então assim, eu ia dar aula normal, e eram as salas com 120, 130 alunos, pra fazer revisão de matéria, revisão de exercícios, para que eles pudessem ter um rendimento melhor nas provas. Isso foi feito durante 3 anos. Aí comecei essa época a dar um curso aqui pra formação de executivos no mercado financeiro, já que eu era sempre do mercado financeiro, então foi por ai que eu comecei.
Pergunta:
Quais são as características de um bom professor?
Resposta:
Primeiro é gostar do que faz. Eu acho que um professor é aquele que gosta do que faz, gosta de dar aula, e se preocupa com o aprendizado do aluno. Você precisa gostar de ser professor, é meio que um sacerdócio. Eu falo isso para as pessoas. Vou falar um caso de hoje, pega um jovem de 20 anos hoje. Vinte, 21, 22. Vamos fazer uma conta. Volta no tempo, este jovem, quando começou um governo que ficou 8 anos, que foi o presidente Lula, e depois foram mais 6 da Dilma, 14, e depois mais 2 do Temer, 16. Esse jovem só tem isso como parâmetro, não tem outra coisa. Não tem como comparar. Os pais dele pouco tem também a comparar, muito pouco. Quando essa época do governo foi boa, 2009, 2010, ele tinha 11, 12 anos, ele nem sabia o que era nada. Quando ele começou a se dar conta, com 15, 16, ele só começou a ouvir desgraça, ok? Lava a jato, resquício de mensalão, PIB caindo, ele nem sabe o que é PIB, mas sabe que quando cai é ruim, desemprego, 20 milhões de desempregados, inflação que estava em alta no governo Dilma, ele só ouviu desgraça, ok? E os pais também falando que aquilo era muito ruim, é o que nós ouvimos. Esse é o tipo de jovem que nós temos nas salas de aula do Brasil inteiro. Ele não tem parâmetro, o ensino deteriorou, ele sabe ler menos, ele não compreende muito o que ele lê, a capacidade narrativa dele de escrever fica prejudicada. Ele funciona muito mais por ícones nos smartphones do que ler e escrever, o raciocínio é, de profundidade, quando falo de uma profundidade de uma tigela, agora falo da profundidade de um pires, e não adianta você apontar o dedo para este aluno e falar: ‘você é culpado, você é isso, você é aquilo'[30']. Ele é o resultado disso, concorda? Então nesse ponto que eu acho que o professor faz a diferença. Os pais para terem casa, carro, apartamento, tudo que tem hoje, muito mais bens de consumo do que se tinha antigamente, os pais trabalham os dois, né? Pai e mãe, o tempo todo. Terceirizaram a educação dos filhos. Fica por conta da tia da escola. E os valores de família, aonde fica? Também estou generalizando. Reeducação e respeito pelos professores. É isso que os professores, hoje, reclamam em sala de aula, nós reclamamos. Além do que os professores estão sendo desvalorizados hoje, no Brasil inteiro. Menos valorizado, pela importância que ele tem na formação dos jovens, pela remuneração que ele ganha, pela oportunidade que ele tem de trabalho. Isso deteriorou. Então professor, eu não acho que seria um bico pra gerar um pouco de renda pra aumentar seu salário. Ser professor é diferente, porque às vezes ele faz o papel do pai, ele é um pouco confidente. Ele tem que ser um pouco mais amigo, e aquela mão que afaga as vezes tem que ser um pouco dura também, ai é onde os alunos não gostam dos professores porque os professores tem que exigir disciplina, respeito a instituição, respeito as pessoas, respeito ao professor, respeito a tudo, e pra isso você se torna uma pessoa inconveniente, um professor inconveniente. Onde eu me vingo do meu professor quando eu faço a avaliação dele? Mas é assim, eu acho que nós temos também que ter a consciência de uma outra coisa: as famílias entregam para nós professores aquilo que elas tem de mais valioso, que não é a casa e não é o carro, são os seus filhos, então veja as responsabilidades que os professores tem. Então assim, que que é ser um bom professor? É ter a consciência de tudo isso. Qual é o desafio? Saber fazer. Ponderar tudo isso, dosar tudo isso, ter paciência pra tratar com esses jovens. Esse é o desafio do professor. E concorre com isto: drogas, falta de perspectiva, e você tem uma coisa que é uma coisa um pouco dramática. E há de se pensar que nesse país apenas 6% da população possui acesso ao ensino superior. Então isso é ser professor. É fácil? Não, muito difícil. O desafio se torna maior cada vez mais a cada ano que passa? Sim, esse jovem chega cada vez mais diferente. Então o que é ser um bom professor? É gostar disso. Se você não gostar disso você fica no piloto automático. Vem dar aula, ganha e vai embora. E é um professor bonzinho várias vezes. Então esse é o desafio.
Pergunta:
Espera ai, quando foi que caiu a ficha que você falou: ‘Levo jeito pra isso?' Você tem essa lembrança de, algum momento em que você parou e falou: ‘Poxa , é por aqui que eu quero ir'?
Resposta:
Tenho. Desde a minha época de grupo escolar da década de 1960, que eu sempre participei de tudo que é coisa que o grupo escolar podia permitir, estava eu lá metido, conversando. No colégio e no ginásio eu fui representante de sala por muitos anos. Na faculdade eu fui representante de classe por muitos anos. Eu fui o único aluno, que naquela época nós tínhamos aqui a congregação [35'], e era faculdade antes de se chamar centro universitário, era um representante só do corpo discente. Eu fui por três anos esse representante, fui representante do conselho departamental, então eu sempre estive muito engajado com as atividades de todas as instituições de ensino que eu já passei. Chega uma hora que você pensa assim: ‘Bom, eu tenho uma facilidade pra falar, eu não tenho vergonha, eu não fico inibindo, então acho que eu sirvo pra coisa'. Foi assim, foi gradativo. Ser monitor também ajudou bastante, então né, você vai dosando e vai aprendendo.
Pergunta:
E a primeira aula? Como foi a primeira aula como professor, professor do IMES?
Resposta:
Nossa, deu um frio na barriga que eu vou te contar, em. eu costumo dizer que a primeira aula parece o primeiro beijo, você não sabe se abraça, se põe a mão, se tira a mão, que que você faz, não é? Então da aquele frio na barriga. Alias, passam se os anos, e dependendo da aula e pra quem você vai dar o frio na barriga não desaparece, certo? Não desaparece. Mas isso é uma sensação boa, porque isso te faz alerta, né? Então você não fica assim, de qualquer jeito, mas foi assim, uma sensação muito desafiadora, muito, e você quer falar de tudo, você ainda não tem experiência, hoje você entra numa sala de aula e você sabe se as pessoas tão entendendo pela cara delas, se sua aula ta agradando, se não ta agradando, mas a primeira aula é difícil, a primeira aula ninguém esquece.
Pergunta:
Você citou aqui há pouco aqui algumas transformações do aluno lá, do comecinho das suas turmas iniciais para o aluno que a gente tem hoje. Da pra falar um pouquinho dessa instituição que você acompanhou? Quer dizer, aquela instituição que você falou que era só ali no pátio B, o que você encontrou naquele momento, e o que você viu evoluir até os 50 anos.
Resposta:
Acompanhar esse crescimento e esse desafio foi muito bom, eu participei muito disso também, porque além de professor, eu estive envolvido com uma série de coisas, que bom, seja como aluno, fui presidente do diretório acadêmico, além de participar da congregação do conselho departamental, ser representante de classe, depois eu participei trabalhando alguns anos nos concursos públicos, aplicando o exame vestibular, eu passei por tudo que foi possível fazer aqui, e eu estive próximo das gestões, eu sempre tive uma relação de amizade, proximidade com todas as gestões, com todos os professores, e essa relação sempre foi muito intensa, foi muito próxima, então eu acompanhei tudo, todas as agruras, a expansão da faculdade, as aulas de pós-graduação, quando foram feitas, as salas, as primeiras salas, a criação de cursos novos, o sofrimentos dos gestores e administradores querendo saber se ia dar certo, se não ia dar certo, então nisso eu estive presente ao longo de todos esses anos, foi muito bom, depois como tudo se transformou em centro universitário, depois a universidade, então foram grandes desafios, alguns momentos delicados, alguns momentos difíceis aqui, porque houve em uma determinada época uma invasão de alunos, uma concorrência tomou conta, não éramos 2, 3 faculdades, nós tínhamos várias faculdades ao nosso entorno oferecendo cursos com preço menor, e nós não podíamos abaixar o preço daqui por ser autarquia, considerava como uma evasão de divisa, nós somos sujeitos ao tribunal, então foram muitos os desafios para serem vencidos e chegarmos aonde nós chegamos. Nós passamos por alguns momentos que eu diria até dramáticos de falar: "Bom, vamos conseguir" e conseguimos.
Pergunta:
Você citou que foi presidente do diretório acadêmico.
Resposta:
Em 1981.
Pergunta:
Me conta um pouquinho sobre essa gestão.
Resposta:
Isso foi um negocio assim, muito bom, Foi um marco. Aliás, eu escrevi no livro, né. Vai sair o livro dos 50 anos da USCS.
Pergunta:
Temos o portal de memórias e temos aí, o livro.
Reposta:
No final dos anos 70 surgiu um novo partido político que ficou no poder e está ai até hoje, perto disso, e o berço foi aqui no ABC.
Pergunta:
Hoje não está mais no poder.
Resposta:
É. Hoje não está mais no poder, mas surgiu aqui. Bom, começou a surgir os primeiros simpatizantes daquela época, os movimentos radicais, e nós tivemos no finalzinho da década de 1970, 1980 principalmente, especificamente no ano de 1980, um grupo que tinha paixões partidárias e que ganhou por eleições, esteve no diretório acadêmico, e transformou o diretório acadêmico num instrumento de politica partidária, compraram uma offset, uma maquina de impressora que nunca esteve aqui, foi pra sede do partido, a maquina copiadora da xerox eles atrasaram o pagamento dela por um ano, e ela se prestava mais para outras finalidades do que a dos alunos, então o diretório acadêmico foi um caos. Eu estava terminando o quarto ano de administração. Eu havia feito economia, terminei em 1979, e em 1980, 1981 administração, e nos tínhamos um grupo de aproximadamente 10 pessoas, que tínhamos feito economia e fomos fazer administração, e eu estava inconformado com aquela situação e fui conversar com alguns professores inconformado também. Bom, foi um inconformismo geral com aquilo. Bom, ser inconformado não acabaria com aquilo lá, só adiantaria fazer uma coisa. Tirar as pessoas. Ai eu conversei com essas pessoas que haviam feito curso de economia comigo, e outras pessoas que conhecíamos. Montamos uma chapa, chamado Realidade, e o slogan era: ‘Volte realidade, vote realidade', e ganhamos [45']. Pra você ter uma ideia, este espaço que estamos aqui, foram milimetricamente disputados com trena pra fazer propaganda politica. Muitos socos, tapas, e até ameaças de andar armados já houveram aqui, pra você ter ideia. Muito acirrado. E nos vencemos. E ai nos provocamos algumas mudanças radicais. Uma delas pra não ficar a mercê de ideologias, a associação atlética era um departamento do diretório acadêmico, do DACO. Mas só que atlético, o pessoal gosta é de jogo, é de competir por outra coisa, não quer saber de política partidária, lembre-se que naquela época nós tínhamos um curso de ciências politicas e sociais, então era muito acirrado. Fizemos uma assembleia e desmembramos a atlética do diretório acadêmico. Alteramos o estatuto, a associação atlética passa vida própria e aquele valor que se destina a pagamento do aluno que era do diretório acadêmico 70% fica pro diretório acadêmico e 30% fica pra associação atlética. A associação atlética passa a ter autonomia, vida própria independente de quem viesse a ser eleito. Isso deu um resultado fantástico. Também fizemos ouras coisas que foi muito bom. Xerox ia tirara a maquina, vamos ficar sem maquina, então pedimos uma maquina melhor. Eles acharam que tínhamos ficado doidos, ai eu fiz um projeto mostrando que nós teríamos condições de reverter essa situação, e pra isso teríamos que ter uma maquina mais potente, porque começamos a fazer apostilas para outras escolas. Saíram daqui apostilas para a Fundação Santo André, apostilas para a FMU, e pra uma outro que não me lembro o nome. Os professores pediam pra fazer a apostila de outros lugares aqui conosco e nós cobrávamos pra isso, e com isso conseguimos pagar a dívida. A xerox achou interessante o projeto, e disse: ‘eu faço isso se o diretor da constituição der um_____ moral, Claudio João _______' que era o diretor. Ai falou: ‘Não estamos doidos, mas precisamos disso aqui'. E ele falou assim: ‘Eu confio em vocês'. Colocou ciente no projeto que nós fizemos, e a xerox colocou uma máquina mais potente. Por decisão judicial, recuperamos a máquina offset. Chamamos um técnico, e nós do diretório acadêmico aprendemos a manusear a máquina, e viemos de sábado e domingo, sujar as mãos de tinta preta da offset para fazê-la funcionar, e ela funcionou e rodava a semana inteira fazendo apostilas, e nós pagamos toda a dívida. E dentro do diretório acadêmico nós criamos um espaço onde três maquinas de escrever, maquinas de escrever, não era computado, na época nem existia. Para os alunos fazerem seus trabalhos eles tinham papel sulfite de graça, tinha papel carbono, porque na época era papel carbono, corretivo, tesoura, lápis, borracha, régua, grampeador, tudo em uma sala, sem ficar trancados, sem nada, sem ninguém pra tomar conta. Tesoura, regra, tudo que você imagina. Nunca sumiu 1 lápis, pra quem achava que em uma semana iam roubar tudo. Se colocou lá: ‘Cuide, é com o seu dinheiro. Se perder, não da pra repor ao menos que você pague.' Fizemos um festival de música amadora, e tem um professor que ganhou o festival, professor que está aqui até hoje, o professor Joaquim. Nós trouxemos gente de rádio FM pra fazer isso daqui, professores de música da USP, não eram nossos amigos que eram jurados não, ok? Locutores, pessoal de cinema, esses foram os jurados. Foi um tremendo festival de música aqui.
Pergunta:
O Joaquim, ele era aluno na época, não é?
Resposta:
E ele colocou uma música que ganhou não sei que lugar. No auditório não cabiam as pessoas, era todo mundo sentado nos corredores, com a porta aberta. Tínhamos um grupo de teatro amador, que vivia reclamando que não tinha apoio do diretório acadêmico, e eram os nossos opositores políticos. E eu falei assim, nada melhor que nossos opositores políticos produzirem e mostrar resultado, e nós chegamos pra eles e falamos assim: "Não entendemos de teatro, mas entendemos de dinheiro, e onde colocar o dinheiro, e que resultado ele produz, vocês querem dinheiro para produzir? Nós não vamos dar palpite como encena uma peça, como é que faz nada, mas eu quero os dias que você encena essa peça, por que eu quero sentar aqui atrás e quero saber se vocês estão ensaiando, realmente, pra justificar o dinheiro que vamos colocar." Esse grupo ganhou em primeiro lugar o festival de teatro amador de Santo André, isso em 1981. E um desses desse grupo é vereador de São Caetano há muito tempo [50'], o Parra. O Parra era da turma do contra. Mas que não era daquele grupo exatamente que... Mas era. Era, fez sociologia.
Pergunta:
O que que a USCS representa na sua vida?
Resposta:
Ela faz parte da minha vida. Eu estou aqui há 42 anos, direto. Desde que eu entrei como aluno até agora. Ora mais tempo, ora menos tempo. Ora fazendo mais coisa, ora fazendo menos coisa, mas 42 anos. Então dois terços da minha vida eu passei aqui, e eu estou aqui dentro. Então representa muito, e é assim, minha segunda casa. Aliás eu passei muito mais tempo aqui do que na minha casa. Eu me sinto em casa. Aqui é uma extensão. Eu me sinto muito bem aqui.
Pergunta:
Como você define essa instituição?
Resposta:
Guerreira. Muito boa, as pessoas guerreiras. É uma instituição que vem crescendo, vem se despontando com tudo que acontece em seu entorno, e ela está sempre crescendo, sempre crescendo, analisando as outras instituições, a situação deles simboliza o que é a USCS hoje. Nós estamos numa situação muito melhor sobre todos os aspectos, eu vim aqui tinham 3, inaugurando o quarto curso, agora temos 38 cursos, e é uma instituição vista com respeito. Tem muito a melhorar, dados os desafios do dia a dia? Sim, mas faz parte, e ela tem conseguido, então eu repito que a USCS é uma instituição de respeito, é uma instituição que cresce cada vez mais, e que faz por merecer o lugar de destaque que se tem na região, e que se sobrepôs as outras. Ao longo do tempo, ela não tinha a projeção que ela tem hoje. Ela conquistou isso ao longo do tempo, com muito trabalho, com muito esforço e com muita competência.
Pergunta:
Você sempre falou que se envolveu em várias áreas, em vários momentos com a universidade, mas recentemente um novo desafio foi assumir a gestão do curso da escola de negócios.
Resposta:
É, isso realmente não tinha me passado pela cabeça, foi uma grata surpresa de assumir a gestão da escola de negócios, tem os curso de economia, ciências contábeis, administração, comercio exterior e administração EAD, e o primeiro desafio já foi remodelar todos os cursos da escola de negócios, e nós fizemos isso em cinco meses, foi um trabalho árduo, contei com uma colaboração fantástica dos professores, e nós transformamos os cursos da escola de negócios, do básico, de 4 semestres para 2. Mexemos em grade horária, sequência de grade horaria, mudanças de disciplina, umas entraram, outras saíram, umas estão sendo reformuladas, e o curso entrou no ar, foi aprovado. Em 5 meses fizemos tudo e o curso foi pro ar, agora estamos com 2 cursos em paralelo, a grade antiga, que vai terminar daqui a 3 anos e meio, e a grade nova. Então esse foi e é um grande desafio. Criamos e agora estamos cuidando dele, colocando no ar.
Pergunta:
Como é o trabalho de um gestor de curso?
Resposta:
Sabe como eu chamo a minha sala? A gaiola das loucas, que é nome de filme da Itália. Ali, cada dia é um dia, não tem receita, não tem regra, eu não tenho agenda, a não ser alguns compromissos marcados. O resto é, se um aluno precisa falar comigo ou com a gestora não precisa marcar dia, não precisa marcar hora, nem nada. O aluno só vai e fala. As demandas são as mais diferentes e incríveis possíveis. É conflito entre alunos, é conflito entre professores, é conflito de toda ordem da natureza, tudo isso que eu relatei, dessa dificuldade [55'], desse perfil do aluno vem pra parte da gestão. O que é ser professor? Se não for o que eu te disse, dada as seguintes proporções, o professor também não se atualiza isso também vem pra dentro da gestão. Então eu faço assim, a gestão é um caldeirão que ferve todos os dias. Você consegue tirar a tampa da panela, mas não consegue apagar o fogo, e é muito desafiador. Conflito em potencial o tempo todo, de toda ordem, natureza, é de prova, é calendário de prova, é calendário de aula, quem fez, por que deixou de fazer, professor que anota, avaliação, a lista de prova, conflito em sala de aula, da pra fazer uma lista extensa. Todo dia tem um pouco de cada coisa. É conversar com aluno, é conversar com professor, estar aqui todo esse tempo tem ajudado muito, porque eu conheço praticamente todo mundo, e isso aqui é uma engrenagem, cada dentinho disso aqui é uma engrenagem, tem que tudo funcionar, e quando faltam dois dentes ela, tipo assim, é a hora que você precisa conversar com marketing, propaganda, comunicação, você precisa de ajuda pra você fazer alguma coisa, é o atendimento ao aluno, é alguém da manutenção, isso ajuda, pra essa roda girar melhor, e também o convívio com professores há muito tempo, como eu estou há muitos anos com eles aqui, eu já sei mais ou menos o perfil de cada um, o jeitão de cada um. O que não gosta e o que não gosta, as facilidades e dificuldades, e isso tem produzido um resultado que eu acho satisfatório. Precisa perguntar pra reitoria e pró-reitoria, mas, pelo menos, os indicadores, o que tem aparecido tem sido bom. Difícil, avançar um pouco já tem sido um grande avanço, um grande esforço.
Pergunta:
Mas seja como professor ou como gestor, você já se deparou com alguma situação que te lembrou seu tempo de aluno? Como você imaginar: ‘Poxa, não sabia que aquela época era assim'. Ou algum conselho que você deu pra algum aluno que era algo que te fez lembrar aqui do seu período?
Resposta:
Ah, já, já. Isso muitas vezes acontece fora da aula, no dia de aula, mas fora, na mesa depois que termina a aula no corredor, isso acontece, de trocar essas experiencias, bater papo com os professores e fazer isso. Te dou o exemplo, professor Leonel, no qual eu fui monitor, nós conversávamos com muita frequência e com outros professores, e tive várias orientações, sugestões. E depois do professor Leonel fui com mais professores o chefe do departamento de economia, um caso bem raro com pouco tempo de docência mas muito tempo com os professores. Comecei em 1985, em 1991, 1992, 1993 fui como o conselheiro do conselho regional de economia, com 5, 6 anos de docência, e foi como conselheiro por três anos. O tempo passou e quem eu substituí? O professor Leonel, depois de 26 anos, mas não por indicação, sim por eleição, então eu me surpreendi por ganhar uma eleição, e agora fui o delegado nacional onde estarei a frente por mais três anos. Tenho a delegacia regional, gestão da escola de negócios, e ainda sou membro consultor da OAB de Santo André, como economista, dar palpites de meio ambiente.
Pergunta:
[___________________]
Resposta:
Olha eu não pinto mais______mas dou curso para______, concedo alguns cursos para eles.
Pergunta:
Eu havia brincado, mas agora falando sério [1:00'], vendo todo seu percurso que começou engraxando sapatos na frente de bares, que reflexão você tem?
Resposta:
Ensinei meus filhos que sucesso se faz com muito sucesso, trabalho, estudo, ser integro, esforçado, e deu certo. Não conheço outra forma se não trabalhar, continuo engraxando meus sapatos, e aquilo que eu disse que pregava eu faço até hoje no meu sitio, não pinto tudo mas pinto muito, é até como um hobby de gostar. Trabalhar faz parte, eu tenho 44 anos ininterrupto registrado. Fui executivo de banco regional, Goiânia, Salvador, fui gerente de banco estrangeiro, tive mais de 30 filiais de banco, funcionários trabalhando para mim, mas é muito boa a universidade. Em meus 39 anos de banco, 25 dei aula aqui. Desses 25 mais sete anos de sábado, e ainda em outras instituições também dei aula, tanto graduação quanto pós. O tempo passou, muito trabalho.
Pergunta:
Me conta um pouco sobre o curso de economia, que completa 50 anos junto com a USCS, me fala um pouco da importância da economia também.
Resposta:
O curso de economia no Brasil está desaparecendo. No estado de São Paulo ou instituições não tem o curso. A USCS em 50 anos, não formamos turma pela primeira vez. Outras instituições não formaram turmas, e quem formou foi apenas uma. O que me motivou a ser o delegado é pensar como faremos esse curso não morrer, mas sim crescer, e te dou um exemplo, estive com 2 diretoras do instituto estadual de educação, estávamos vendo de ver em 25 escolas na região, dos 7 municípios, e dessas 35 escolas nem todos tem o segundo grau, mas temos um potencial de 5000 alunos no segundo grau. E o que eu as convenci foi, se eu te perguntar o que faz um médico, dentista, você sabe, advogado, mas e um economista? Fica uma interrogação? É uma formação que te permite avaliar tudo que ocorre em seu país e tudo que ocorre interna e externamente [1:05']. Emprego, desemprego, PIB, gente, isso sempre ocorre, e só um economista pode explicar, mas se tem a falsa ideia de que economia é ciência exata, mas é ciência humana, social, a parte quantitativa de análise são coisas de dentro do curso, você inclusive deve fazer modelos, mas sempre acham que é matemática e não sabem o que fazer, então deixam de fazer economia para fazer administração, e muitos ainda acham que deveriam ter feito economia, então o que estamos pensando para chegar aos estudantes do segundo grau o que é um curso de economia, as várias áreas, dá para se estender em 20 áreas, e vamos na televisão para falar o que está tendo de errado, e não só trabalhar ao governo, e tem muitos trabalhos dos diversos segmentos, é que isso não se mostrou, não tem demanda e está se fechando no Brasil.
Pergunta:
[______________]
Resposta:
Engenheiro, não economista, o Meirelles é engenheiro, Massachussets, brilhante, mas engenheiro. Mercado financeiro tem muito engenheiro.
Pergunta:
A gente deu uma pausa na sua história falando de quando o senhor chegou na faculdade e falou que aos 22 anos deixou a casa de seus pais. Me conta um pouco sobre esse momento.
Resposta:
Me casei no primeiro ano de faculdade, ainda com seis meses na USCS e aquele sonho, quando me formar vou ser alguém, foi a ascensão nos bancos que trabalhei acompanharam os estudos, só tivemos filhos depois de quatro anos, fizemos um acordo para eu não ter risco de interromper a faculdade, meu filho nasce quando já havia terminado economia, tenho três filhos com esse que nasceu em 1980, e depois tenho dois filhas que nasceram dois anos e dois meses de diferença. Uma veio fazer Rádio e TV, parou, mas ano passado veio me dizer que se arrependeu, foi fazer fotografia na Panamericana, depois fez Educação Física e depois fez fisioterapia. E uma outra que é psicóloga do hospital das clinicas e tem seu consultório. De netos tenho dois de um dos filhos, da outra que estudou aqui por cinco meses, e prometeram que ano que vem terei outra. Tenho três filhos, 38, 36, 34, com dois netos, e depois minha esposa que trabalhava na WolksVagen passou no concurso no tribunal regional do trabalho, aonde tivemos os três filhos [1:10'], fez o curso de direito, advoga há mais de 20 anos, foi professor universitário de outra instituição, não gostou da carga, dos alunos da forma que agiam, muito trabalho, não valia a pena, deu aula de pós, fez administração e terminou em outro lugar, e hoje ela advoga mas em menos, estamos começando uma fase de desaceleração, tirado com gestão, aí eu estou mais, ainda estou em salas de aula mas vou diminuindo, é uma rotina doida, eu e minha esposa, começando a curtir netos, a família. Parei de fumar fazem mais de 20 anos, mas tenho uma paixão que é de vez em quando o charuto.
Pergunta:
Eu entendo que economista tem de vez em quando de acabar fumando, pois faz a conta de ver o que gasta. De tesouro nacional teria agora...
Resposta:
Mas se for pensar assim eu produzi muita riqueza comprando remédio de estômago, ganharia muito dinheiro nisso, faria circular riqueza. Vou te falar uma coisa, trabalhei em banco na época que você estava atendendo um com 2 no telefone em cima de sua mesa e com mesa de operações. E você fumava também, e se percebia que começava um mas havia outro na metade em sua mesa queimando. Aí eu parei um dia, pois eu hvaia começado o terceiro, fumava quase 3 maços por dia, e a vida é generosa por deixar meu pulmão funcionar.
Pergunta:
Tem alguma outra história, fato, coisa que seria legal deixar registrado? Aqui mesmo na universidade.
Resposta:
Tenho, poucos sabem. Éramos professores que fazíamos muitas expedições em cavernas, no parque estadual. Fizemos durante anos explorações, algumas estão até proibidas. Fizemos ao longo dos anos. Caminhadas a serra do mar. Fizemos rafting, os professores, e uma coisa diferente, os filhos e esposas participavam.
Pergunta:
Você está falando do mesmo grupo de professores nesses todos?
Resposta:
Dos que estão aqui hoje. Santander, o professor, o Joel, fez muito conosco, o professor Di Agustini, esses mesmo que restaram.
Pergunta:
Mas como que surgiu essa ideia?
Resposta:
Isso surgiu do Ramon, que esteve conosco há muito tempo e era professor da fundação Santo André [1:15'], e tinham professores que faziam espeleologia, um que era o professor de geografia e o outro que era u médico da fundação cardiologista, e por aproximação nos juntamos, e pegávamos vans de noite, para no sábado fazer. Ficávamos o dia inteiro, dormindo em pousadas no meio do mato, por uns 5 anos. Os nossos filhos cresceram juntos, então temos uma lembrança grande, encontrei o filho de um professor, que na década de oitenta eu fiz pipa para o mesmo. A Ester que é professora de direito quando menina fingia ser professora, em festa junina, que todos fazíamos, ajudávamos, colocávamos a mão na massa, na festa do queijo e vinho, um dia antes ficávamos cortando o queijo, a cerveja para gelar e a noite fazer a festa. Assim nasceu a associação. Dançamos muito, festas temáticas. Você consegue imaginar eu e o Oliva de palhaço no chão, professores daqui de ciganos em festa fantasia? Isso foi a APROXIMES, 20 anos atrás, acabou um pouco hoje, mas tinham as festas, que pare do grupo fazia espeleologia.
Pergunta:
Com toda essa experiência que você tem como docente da USCS, docente, que dica você deixaria para as novas gerações que chegam aqui?
Resposta:
Participar, ser. Usufrua de tudo aqui dentro. Professor não vem só para dar aula. Muitos professores chamei para fazer coisas novas e tem os olhos brilhando, coisa que não veio há muito tempo. Atividades com alunos, muitas cosas, se sentir que pertence, faz parte disso, e aí tenho orgulho, é bom, mesmo sendo difícil. Acho que a pior coisa é o aluno que entra, assiste a aula, uma parte está em aula e a outra não. A forma de dar aula hoje deve ser diferente, questionam mais, não tem tanta paciência, aulas giz cuspe e lousa não tem mais, agora é mais Power Point [1:20'], e não nada ultrapassado, tem professores nossos testando em salas aplicativos para dar aula de maneira diferente, não são obrigados mas tem sido feito, o professor não pode apenas dar aula, deve ter algo que o motive, e com todos os desafios que há na sala. O jovem hoje é muito diferente, mas não do de 10 anos, mas sim o do semestre passado. A velocidade, tudo que os jovens passam, precisa tomar cuidado, porque pode ter distanciamento. Esse é o desafio, e muitas instituições fazem isso. A dica é pertencer, ver que depende de seu sucesso, não só dar e assistir aula. Criar um clima, todos somos partes importantes. Não pode apenas um fazer sua parte, todos devem fazer a roda girar. Trabalho, família, esse é o nosso grande desafio, seres humanos, jovens, e esse ensinar é bom, desafiador, mas não é fácil. Pense que você pertence e pode fazer a diferença, mas para o bem, se não, não se constrói. Um tijolinho a cada dia para a parede.
Pergunta:
Mais algum recado para se deixar?
Resposta:
Essa mensagem que me sinto feliz aqui, eu gosto disso, o tempo é relativamente finito, pois a cada tempo que passa você passa menos em uma hora para. E pedir para pedir ideias, criticar para ajudar, como eu posso contribuir, uma pequena ajuda é fundamental, eu ficaria uto feliz se as pessoas que ajudaram a construir a USCS, enquanto ficarem aqui ajudarem a crescer mais, deixar uma história para quem puder ver esse movimento que eu acho que foi uma ideia excepcional para conhecerem como é nossa casa, para não se esquecer. Muitos se foram, mas para pensar que dá para fazer diferente. Essa é minha mensagem, esperança, e ficaria muito feliz se pudesse ver isso acontecer.
Pergunta:
Bom, só tenho a agradecê-lo pelo tempo, a história.
Resposta:
eu que o agradeço pela oportunidade, obrigado mesmo.
Lista de siglas:
IMES: Instituto Municipal de Ensino Superior
USCS: Universidade Municipal de São Caetano do Sul
DACO: Diretório Acadêmico Catorze de Outubro
EAD: Educação à Distância
APROXIMES: Associação dos Professores da USCS